Quantas vezes ouvimos “você tem que ser 3 vezes melhor” sendo uma pessoa negra? E sendo uma mulher negra?
Desde criança tendo nossos corpos sexualizados, marginalizados, maltratados. “Mulheres pretas são Deusas”, “Mulheres pretas são mais fortes”. Eu, pessoalmente, já passei por isso inúmeras vezes. O que será que tem a ver a tal da "Síndrome da Impostora”?
Já dizia Emicida:
“Portanto, meu irmão, preste atenção no que vende o rádio, o jornal, a televisão você quer o vinho, eles encarecem a rolha, deixa de ser bolha e abre o olho pra situação”
O que a gente ouve, muitas vezes, é o que a gente ACHA que a gente tem que ser, e olha... quando sobra tempo para a gente ser humana?
O conceito de Síndrome da Impostora começou a ser falado por duas mulheres brancas em 1978 e, se uma mulher branca, privada de muito menos direitos que nós, mulheres pretas, se sentem assim, imagine nós, mulheres pretas, que fomos totalmente esvaziadas de qualquer subjetividade. Elas conceituam, brevemente, a partir de uma noção de que “a pessoa desconfia de suas próprias competências e não consegue aceitar e admitir suas conquistas”, em um livro que leva o mesmo nome que o conceito.
Você já parou para pensar
que muitas pretas com tripla jornada, colocadas como as mulheres mais fortes na mesma proporção que sofrem a maior parcela de violência de todos os eixos, inclusive sendo negadas de terem afeto, não consideram que seus trabalhos corriqueiros, do dia-a-dia, são conquistas, porque, de fato, muitas vezes eles são consequência do que se faz para sobreviver. Será que uma trabalhadora do lar, ou uma dona de casa, consegue atribuir qualquer valor ao seu trabalho? A sua pessoa?
O que é a Síndrome da Impostora para as nossas senhoras de 60, 70, 80 anos? Será que tiveram conquistas o suficiente para que entendessem que não eram merecedoras ou será que estavam trabalhando tanto para conseguir o mínimo, que não havia tempo para qualquer tipo de reflexão?
E quando não é assim, quando furamos a bolha, e estamos em outros lugares não construídos para nós, e somos desapropriadas de nossas próprias origens, como se tudo tivesse sido fruto do mesmo caminho que mulheres brancas privilegiadas, será que temos a mesma condição de nos olhar na mesma altura?
A síndrome da impostora é fruto do machismo
o que por si só já é bastante tortuoso, e como se não fosse o suficiente, o racismo está, tão vivo, atualizado e pútrido. O que quero dizer é: No fim das contas, penso que, para além da ideia de que não reconhecemos nossas conquistas profissionais, muitas vezes não conseguimos reconhecer nem que estamos sobrecarregadas do “básico”, do esforço fora do normal para cuidar das casas e das famílias. Nós, por nossa vez, somos impelidas de nos considerarmos vitoriosas, já que fica muito difícil nos vermos como conquistadoras do que adquirimos. Não temos qualquer tipo de validação externa que nos ajude a construir o que nunca foi normal, muitas vezes temos somente o contrário. E mesmo quando vamos muito longe, ainda sim, podemos sofrer por ter conquistado muito mais do que nossas famílias, por outras pessoas da nossa família ou do nosso ciclo não poderem viver o que estamos vivendo, o medo de acordar e ter perdido tudo, como se tudo fosse um ilusão, ou como se não pudéssemos fazer nada além de guardar recursos porque, né… vai que algo dá errado....
Michelle Obama (Isso mesmo, a ex-primeira dama dos EUA), também sofreu com isso, e ainda disse que, às vezes, ainda sofre, e acho que ninguém melhor que ela para fechar essa reflexão:
Repeti as mesmas palavras para mim muitas vezes, em meio a muitas escaladas. Sou boa o suficiente? Sim, eu sou"
Além disso ela fala que:
Essas inseguranças "assombram" as mulheres negras em particular. “A mensagem enviada desde que somos pequenas é: talvez você não seja boa o suficiente, não chegue muito alto, não fale muito alto", diz ela. "Meu conselho para as mulheres jovens é que vocês têm de começar tirando esses demônios das suas cabeças."
Texto escrito por Lhayla Basílio, psicóloga Clínica no @cantobaoba Psicologia. Atuou como técnica Psicóloga do SEAS Cidade Ademar. Experiência de estágio na saúde mental em CAPS Adulto (Saúde Pública) e Clínica (Psicoterapia), além de experiência com Oficinas e Grupos Terapêuticos. Trabalho de 2 anos com Psicologia Jurídica e Social. Breve experiência com Saúde do Trabalho e Recrutamento e Seleção. Engajada e motivada por um trabalho que contribua com a igualdade social, garantia de direitos, respeito ao ser humano, prevenção e promoção de saúde.
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